Uma semana, três livros

Por We can be readers - janeiro 29, 2021

Olá, arrombadinhos telespectadores de BBB21 do meu Brasil! Como estão as coisas por aí?

Por aqui, anda tudo meio coisado, mas esse é o nosso verdadeiro "novo normal", então o melhor é abraçar o capeta e arder no fogo do inferno. 

De modo a deixar o blog sempre lindo e iluminado de resenhas ou até mesmo indicações básicas, resolvi fazer esse post sobre três livros que li nessa semana que passou.

Vamos lá? 

1. Meu corpo ainda quente,  Sheyla Smanioto

A Sheyla já foi muito comentada no podcast e aqui no blog. Dona de uma escrita forte, agressiva, uma escrita provocadora, ela não decepciona nada em seu segundo romance, Meu corpo ainda quente. Eu comprei o livro diretamente com ela e veio com cartão e autógrafo, muito massa! <3 


Eu vou trapacear e colar a minha resenha do Goodreads aqui, pois é muito sincera:

Assim como Desesterro, esse romance possui uma cadência muito peculiar e você deve ler com muita atenção para não se perder (embora eu não saiba se captei tudo direitinho).

A experiência de leitura é amplificada pelo tom vermelho entre as páginas, realçando toda a violência da cidade fictícia, Vermelha, onde os corpos descartados na época da ditadura vão parar.

Esse dado sociológico histórico do Brasil não é aprofundado, mas colocado como síntese no livro na quarta capa. Claro que existem elementos e discursos dentro da narrativa que reforçam isso, mas o principal é a relação entre a Mãe (Antônia) e a filha (Jô). A posse do corpo das mulheres, para mim, é o grande fio "costurador" da narrativa. E tudo dito de um jeito metafórico e intenso, um jeito que a maioria das mulheres já deve ter se percebido. Ouso dizer que a experiência de leitura de Meu corpo ainda quente é muito mais intensa para as mulheres.

Violências (nem tão) silenciosas dentro de casa, uma Mãe repetindo "só morre quem não presta", um Pai autoritário e uma filha que, diante de um acontecimento chocante, se vê migrando para a capital - o que não dura muito tempo, pois volta para recolher os cacos de muitos corpos...

Gostei muito da história e fiquei tocada pela impossibilidade de Jô amar uma pessoa, devido a essa enxurrada de narrativas sobre os nossos corpos, corpos que estamos lutando para recuperar o direito de ocupação.

Vocês sabem que eu adoro deixar um trecho motivacional da obra, então tá aqui: 

Antes eu achava que se uma mulher sabia desaparecer, seu Corpo também aprendia. Mas você enxotava o Corpo da Hilda, Mãe, e ele mesmo assim não ia embora, não fugia, ele pesava feito cachorro no pé, feito tronco, você implorando e o bicho não desaparecia. Sozinho um Corpo nem sabe como.
Não é acaso. Desaparecer um Corpo. Não é simples sumiço.
Cada corpo que desaparece é político (SMANIOTO, 2020, p. 25).

Pra completar, olha esse cuidado estético com as folhas... mais simbólico impossível!



2. A criança em ruínas, José Luís Peixoto

Poesia, tá? E eu sei que vocês não gostam de poesia, pelamor da deusa. Todos os episódios do podcast sobre poesia simplesmente FLOPAM. Puxa, que desamor é esse? A poesia é a coisa mais séria da vida. Fora da poesia não há salvação, me ensinou uma grande mentora e amiga.

O José Luís Peixoto é um escritor português que uma amiga minha (a Elisa) A D O R A. Ela me emprestou todos os livros dele, mas acabei lendo apenas - "apenas" - Uma casa na escuridão (romance) e os três livros de poesia, A casa, a escuridão; Gaveta de papéis e A criança em ruínas

Na verdade, essa é uma releitura. O tema do livro gira em torno do luto pelo pai, coisa que Peixoto também vai reelaborar no livro Morreste-me, que não sei bem se é romance ou o que (eu tenho, mas ainda não embarquei). 


Os poemas são pesados, sofridos e, ao mesmo tempo, belíssimos, nostálgicos, emocionantes. Talvez ter perdido meu pai tenha me deixado sensível ao luto do poeta.

Eu poderia citar vários trechos lindíssimos, mas deixo apenas o último poema do livro:

não, ninguém saberá o que aconteceu.
estou muito cansado.
apetece-me dormir até morrer.

(PEIXOTO, 2017, p. 74) - o livro foi publicado originalmente em 2001. 

3. Regresso a casa, José Luís Peixoto 

É o mais novo livro de poemas de Peixoto, publicado em 2020, após um hiato de 12 anos longe da poesia. 

Pensando que foram compostos em virtude da quarentena, havia um grande risco que fosse um amontoado de clichés. Porém, o escritor conseguiu colocar alguns clichés bem distribuídos, que não perderão o sentido daqui a 50 anos.

Há luto, amizade, partidas e chegadas, mobilidade e imobilidade. Está bem bonito.


Ainda, achei lindos os poemas feitos para os livros dele ou sobre os livros, não sei explicar. Ficou bem interessante esse caminho de volta a casa poética. Até para os tradutores de suas obras ele dedica poemas. 

Como a tendência do Peixoto é não ser tão sucinto, vou deixar um trecho de poema (o que é uma violência sem tamanho):

Repara na manhã que nos rodeia.
Saúda essa claridade, é um sopro
a correr-nos nas veias. Em tempos,
escrevi: quando me cansei de mentir
a mim próprio, comecei a escrever
um livro de poesia. Hoje, voltei a
aprender essa lição e, por isso,
estou aqui, estamos aqui. Por isso,
acendi a existência que nos rodeia
e nos preenche, que está em toda
a parte apenas porque estamos 
parados diante desta palavra:
manhã.

(PEIXOTO, 2020, p. 5)

E o poema segue lindamente. 

Não é um livro excelente, mas, como falei, as chances de cair num clichezão do sufocamento era grande e isso não aconteceu.

Gente, é isso por hoje. Espero que estejam bem e sigam firmes na luta por viver mais um dia.

Até! 

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